10 de nov. de 2013

ACONTECEU NO MUSEU: transbordamentos



Graziela Andrade

Tempo delongado e espaço transbordado, ontem, no MAP. Borda d´água, uma ação de superfície, de Julia Panadés, trouxe para o salão do museu um plano da lagoa da Pampulha, que dali se derramou pelos jardins do prédio, indo ao encontro do próprio objeto homenageado. 

Borda D'água. (Foto: Luiza Palhares) 

Ocupado pela forma sinuosa da lagoa em feltro e com seus braços estendidos por toda parte, o mármore poroso que reveste o chão do 1º andar passou a ser pisado entre as brechas do tecido. Provocados, os visitantes precisaram criar uma nova articulação com o espaço. Foi interessante perceber a recusa dos pés em pisarem a obra, quase como se essa ação pudesse molhá-los. 

O desenho espalhado direcionou o corpo de quem o atravessava e, ao mesmo tempo em que provocava desvios de passagem, apontava para um caminho vermelho de prosseguimento infindável, pois, sendo concluído na lagoa, o trabalho propôs seu próprio recomeço, navegando entre o simbólico e o real. Como parte da obra e promovendo uma rede entre linguagens artísticas, foi concebido e distribuído um livreto que apresenta poesias e desenhos de superfície profunda. 

Lagoa no piso do museu. (Foto: Luiza Palhares)


Do lado de fora do prédio, o coletivo Xepa, em Ação de abraçar o que resta, fundia-se à paisagem, fazendo pertencer a ela os corpos de Marcelino Peixoto e Viviane Gandra. Marcando uma existência passada, da qual há ainda alguma permanência, os artistas estacionavam sua matéria em restos de árvores, e no abarcamento prolongado pareciam se enraizar ao lugar. Aderindo ao sol, aos insetos, ao contato com a grama, o que os corpos misturados ao histórico jardim de Burle Marx evidenciavam era a ausência mesma, ou seja, a falta que também resiste ao tempo - pela parte do tronco das árvores que ainda resta.  

Ação de abraçar o que resta. (Foto: Luiza Palhares)

Do segundo andar, alguns visitantes vigiavam, pelos vidros, o deslocamento dos abraços no cenário de fora, buscando pelos personagens camuflados, como quando tentamos detectar a presença de animais soltos em algum lugar: olha lá, ele mudou de lugar! Ali ele, tá vendo? Do lado da árvore. Estendendo-se no tempo e mantendo-se no espaço, aqueles corpos, pela simples exibição da permanência, também parecem ter transbordado os limites da paisagem que passaram a compor.


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